quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Anarquia no Brasil


Acordei mais cedo que o habitual. Senti que era um dia diferente. Os ruídos de fora eram estranhos. Abri a janela e vi as ruas de minha cidade repletas de pessoas agitadas. Gente que falava, gesticulava e esboçava sorrisos estranhos, com caretas incrédulas. Outra enchente de lama? Aqui também? Não, o tempo é de chuva, graças a Deus, mas nem tanto. Foi então que soube. Liguei a televisão, e estarrecida assisti ao noticiário que explodia em plantões nervosos. Desceu do Céu um emissário especial trazendo uma ordem suprema, divina e misteriosa que mudaria todo o destino do país.
De agora em diante não mais teríamos presidente, governadores, ministros, senadores, deputados, chefes de gabinetes, secretários, secretários de secretários, prefeitos, vereadores, assessores, assessores de assessores, tampouco partidos políticos. O país, seus estados e cidades seriam agora governados por um conselho de cidadãos, filhos da pátria, voluntários, cujas únicas condições para exercer seus cargos seriam a HONESTIDADE e o AMOR por sua terra e por sua gente. Os salários dos políticos, até então, inacreditáveis e inimagináveis fortunas que fariam inveja ao pobre tio Patinhas, e fariam corar a nababesca corte francesa de Maria Antonieta e sua turma, seriam destinados para creches, educação, saúde, estradas, construção de vias férreas e outras necessidades reais da população. Os funcionários remunerados seriam aqueles que trabalhassem de fato, gente comum. E também aqueles que tivessem por função a verdadeira utilidade pública, como limpeza das cidades, jardinagem, ensino público, enfim, a administração necessária em geral. E semanalmente, os membros do conselho federal, estadual e municipal se juntariam a esses servidores para pessoalmente e efetivamente por a mão na massa, ou seja, cuidar de sua amada terra.
Todos os políticos e afins ladrões cumpririam pena de prisão perpétua e eterna, com tornozeleiras, braçadeiras e o diabo a quatro que os manteriam trancafiados para sempre, ou melhor, passariam o resto da vida limpando o Rio Doce, o oceano e cidades atingidas pela lama tóxica e a lama moral.
Os partidos políticos estavam extintos. O conselho agora seria composto por cidadãos que tomassem um único partido, o da solidariedade. Incrivelmente, logo surgiram pessoas para o conselho voluntário. Aposentados, estudantes, homens, mulheres, jovens e velhos, todos imbuídos do ideal de bem conduzir o país e as cidades para o progresso e harmonia. Afinal, um país sem presidente, estados sem governadores, cidades sem prefeito? Sem secretários, sem vereadores? Seria possível? Anarquia? Fim do mundo? Utopia? Loucura geral?
Não, não, apenas um sonho. Acordei novamente. Olhei pela janela e vi engarrafamentos e pessoas que se arrastavam sob o peso da triste e corrupta realidade brasileira. Olhei para a televisão e assisti às mais incríveis e criativas notícias de corrupção, ao duelo entre políticos bandidos que se digladiam sem se preocupar nem um instante com a pobre população. É, é tempo de oração.


                                                                                               

Nenhum comentário:

Postar um comentário