Quando
foi que rimos com gosto, quero dizer, gargalhamos, rimos tanto que a barriga
doeu e as lágrimas de alegria saíam profusamente de nossos olhos? Quem nos dera
que as lágrimas fossem sempre de alegria. Quando foi que choramos de rir?
Talvez tão intensamente assim tenha sido apenas quando éramos crianças ou bem
mais jovens, quando ainda não conhecíamos o lado difícil da vida, ainda não
tínhamos sofrido perdas dolorosas, quando a vida era mais fácil, quando não
tínhamos que trancar portas durante o dia, nem precisávamos de cercas
elétricas. Talvez quando ainda não tivemos que lidar com a falta de um emprego
ou a doença na família. Pois é. A vida é de um jeito hoje e de outro jeito
amanhã. Entre a manhã e a tarde se muda o tempo, diz a Bíblia, e é verdade. Todavia,
não adianta ficar alegre só quando tudo vai bem, é preciso também aprender a
ser alegre quando tudo vai mal. Olha só quem fala, logo eu, que qualquer coisinha
já vira bicho de sete mil cabeças para mim. Eu também preciso aprender, é
difícil, quase impossível.
Quanto
mais o mundo se moderniza, permitindo muitas facilidades ao toque de um botão,
as pessoas se tornam mais desanimadas e sofrem com a ausência de alegria. A
Organização Mundial da Saúde estima que bem mais de 500 milhões de pessoas
padeçam de uma tristeza crônica acompanhada de irritação ou mau humor, é a
distimia, que dizem ser uma doença relativamente nova. Li um texto do Pe.
Wagner da Canção Nova em que ele fala sobre “rascunho de alegria”, ou a alegria
que vem de fora para dentro, ou aquela alegria que passa rápido como a compra
de um carro novo ou um novo aparelho celular, ou ainda do efeito de um mero
elogio. Bom, esta alegria logo se esvai como água.
O
que nos resta? Se as coisas já estão feias, ficar mais tristes ou insatisfeitos
ou deprimidos só fará tudo piorar mais ainda. A saída é cultivar a alegria
interior, a que vem de Deus, que nos faz viver “entristecidos, porém alegres”
como nos aconselha São Paulo. E também cultivar o senso de humor. Quem tem que
não o deixe ir embora, e quem não o tem, que aprenda a ter. Pe Wagner cita uma
frase de Santo Agostinho: “Ó homem, ó mulher, aprenda a dançar senão os anjos
do Céu não saberão o que fazer contigo”. Viu só?
Mas
eu ainda vou pela estrada da literatura e cito Guimarães Rosa porque o tema da
alegria é bastante presente em sua obra. No conto “A menina de lá”, o autor nos
mostra uma criança sensível e sábia em que a existência é plena de conformidade
e alegria. Em “O espelho”, o narrador relata em primeira pessoa sua conclusão
de que a vida seria então experiência extrema e séria, que exige o
“despojamento de tudo o que obstrui o crescer da alma, o que a atulha e
soterra”. E no livro “Manuelzão e Miguilim”, eu cito uma frase sobre a alegria
que eu amo de paixão: “Miguilim, Miguilim, vou ensinar o que agorinha eu sei,
demais: é que a gente pode ficar sempre alegre, alegre, mesmo com toda coisa
ruim que acontece acontecendo. A gente deve de poder ficar então mais alegre,
mais alegre, por dentro”.
Nem
sempre é fácil, aliás, quase sempre é muito difícil, o segredo é o desapego, o
despojamento de tudo que não deixa nossa alma crescer como tão bem diz Rosa.
Vamos aprendendo, vamos aprendendo.
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