Há alguns anos atrás escrevi uma
crônica sobre meu sobrinho neto que então era ainda um garotinho. E agora, há
apenas alguns dias curti uma foto dele postada pela mãe. Olhei, olhei e
procurei o garotinho que eu sempre conheci tão bem. Ainda é um garoto, ainda
tem ares de garoto, mas da noite pro dia nasceu nele um quê de rapazinho, não
sei se é o olhar, se é o jeito de sorrir, não sei definir, algo como se o
menino tivesse sido investido de uma pequena seriedade, ou tivesse perdido um dos
poderes do encantamento infantil. Ganhou um novo traço, desses que não são
físicos, que vêm de dentro se esgueirando misteriosamente, e que acabam por se
revelar no semblante, ora sim, ora não, alternando com traços infantis, até que
por fim vão se tornar permanentes. Claro que tudo isso ainda é muito sutil,
percebido apenas por quem tem a sensibilidade extrema de observar uma criança.
Não
sou mãe. Limitei-me ao longo dos anos a raspar o restinho da panela de meus
irmãos, amando meus sobrinhos e agora sobrinhos-netos com louco amor. Digo isto
com o maior orgulho porque não lamento não ter sido mãe. Deus sabe o que faz.
Eu teria metido os pés pelas mãos. Sou absolutamente neurótica com proteção.
Pra se ter ideia da loucura desta neurose, imaginem que quando meu sobrinho de
17 anos na época veio morar comigo, eu queria porque queria por telas nas
janelas. É claro que não pude externar minhas preocupações e meu secreto
intento, temia que me internassem. Não tinha cabimento. Não, definitivamente eu
não poderia ter sido mãe.
Sempre
tendemos a achar que nossas crianças são as melhores, as mais inteligentes e
engraçadinhas. Isso porque convivemos com elas no dia a dia e assim vamos
assistindo às suas notáveis tiradas. Mas a verdade é que todas as crianças, de
modo geral, são assim. É que puxamos a sardinha para nosso lado, não é? É que o
amor é tanto que a gente não resiste, não desiste e insiste em mostrar para o
mundo as fotos e filmes dos nossos fabulosos pirralhos. Já vi tias que
guardavam os dentinhos de leite de cada um, fazendo até colares, imagine só!
Eu, nem tanto!
Mas
voltemos ao meu sobrinho-neto, o Menino Caramelo, assim o apelidei. Um amor de
garoto! Desde bem pequeno ficava tentando amarrar o cadarço no tênis até que
conseguiu, e ai de alguém se dissesse: deixa que eu amarro pra você! Ele dizia
meio irritado: “eu sei”. Como tudo hoje em dia é filmado, assisti à cena em que
o pai ensinava o garoto a andar de bicicleta sem a rodinha. É claro que o
menino caía algumas vezes e o pai, tentando dar aquele apoio, dizia: “não
desiste, vamos de novo”, ao que o pirralho respondia: “eu nunca desisto”. Achei
uma graça!
O
Menino Caramelo nunca se incomodou com a opinião dos colegas, muito menos dos
adultos. Colocava a mochila nas costas, saía cantando alto e ia para a escola
na maior alegria! Também era e é o dono do mundo! Canhotinho, toca sua
miniguitarra cantando a plenos pulmões junto com o pai músicas de Raul Seixas.
Era fã incondicional do Homem-Aranha (agora não sei) e suas festas de
aniversário não podiam ter outro tema. Naquela época me disse que seu filho
iria se chamar “Peter Parker”. Adora um Milk-shake, curte de montão
aniversários e sorvetes, não perdia (agora não sei) um capítulo do Carrossel e
ainda por cima se vestia (agora não sei) de anjo para coroar Nossa Senhora,
aliás, ele tem cara e cabelo de anjo.
Mas
ainda é criança porque as crianças, ainda que usando computadores de última
geração, ainda vivem num mundo mágico e misterioso que também nós conhecemos
num passado distante, mas nos esquecemos porque ficamos adultos e chatos.
Assim, até tempos atrás quando o Menino Caramelo caía e se machucava, deixava a
criança que existia nele se mostrar: esquecia a independência, botava a boca no
mundo e não abria mão do colo amoroso da mãe que sabia consolar e curar com
beijos carinhosos. E este consolo, ah, este sempre vai ser o mesmo, desde os
primórdios dos tempos até hoje e para sempre.
Hoje
percebi que o Menino Caramelo cresceu, que bom! Ganhou aquele quê de rapazinho,
nada mais justo, mais normal e saudável do que crescer. Mas fiquei pensativa,
nostálgica. Fiquei me lembrando de minha própria infância já vencida há
séculos. É que tudo passa, e agora não temos mais bebês na família. Sinal de que
a idade chegou! Nada de tristeza! Bora comemorar o dia das crianças!
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